As comunidades virtuais voltadas para a preservação do patrimônio histórico da cidade estão em estado de alerta. O Palacete ou Solar São Lourenço está envolto em tapumes.

Em setembro de 2022, a construção, que fica na esquina da Ruas dos Inválidos com a do Riachuelo, no número 193, teve o seu destombamento suspenso pela juíza Mariana Tomaz da Cunha, da 28ª Vara Federal do Rio de Janeiro. O imóvel corria o risco de demolição.

A decisão da magistrada, na ocasião, ocorreu após o acionamento do procurador Sergio Suiama, do Ministério Público Federal (MPF), contra a direção do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que destombou o imóvel colonial ilegalmente, em divergência interna, como apontou o jornalista Anselmo Gois (O GLOBO), na época. O Solar é tombado desde 1938.

“Vislumbro que o cancelamento do tombamento configurou conduta vedada às partes, procuradores e participantes do processo, porquanto representa a prática de inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso, o que configura ato atentatório à dignidade da justiça”, decidiu a juíza, conforme reportou o jornalista, acrescentando que a decisão da magistrada previa a interdição imediata do imóvel pela Prefeitura para prevenir danos à estrutura.

A página Brigada do Patrimônio ressaltou em sua publicação que as alturas das madeiras dos tapumes, “umas mais altas e outras mais baixas”, poderia indicar a colocação de “uma placa IMENSA de obra”, para a divulgação de uma possível intervenção, destinada à requalificação ou recuperação da construção histórica.

Inspirado no Paço Imperial da Praça XV, a edificação é negligenciada pelas autoridades. Com três andares, as fachadas da construção correm o risco de desabamento e o interior do Palacete está completamente destruído.

O prédio, que ocupa um terreno de aproximadamente 1.200 m², foi residência do Visconde cujo nome carrega. Com as molduras das janelas em cantarias de pedra, e sacadinhas, no espaço funcionou um colégio e, depois um cortiço, com 68 quartos e 500 moradores ao mesmo tempo.

Durante muito tempo, o local também foi usado como um estacionamento, até que um incêndio o destruiu parcialmente nos anos 1990, deixando parte de sua fachada de pé.

O Solar foi um dos primeiros imóveis tombados pelo Iphan, que entrou em atividade em 1934. O imóvel é considerado “preservado” pelo decreto 11.883/1992, da Prefeitura do Rio, que criou a APAC da Cruz Vermelha.

Em um posicionamento inédito, o imóvel que, segundo corretores, era ofertado por R$ 5 milhões em 2022, foi destombado pelo órgão federal, como consequência de um processo administrativo iniciado em 2014.

Na ocasião, o DIÁRIO DO RIO entrou em contato para esclarecer a situação e foi informado por servidores do órgão que o destombamento ocorreu em Brasília, por ação direta da presidência do órgão, com base no Decreto Lei Federal 3866/1941, cabendo ao próprio Presidente da República fazê-lo.

Para destombar a construção colonial, o Iphan alegou “falta de materialidade“, mesma com a presença da sua fachada, com 2 pavimentos de pé direito altíssimo, ocupando a esquina de vias movimentadas da Lapa.

Mesmo com o seu interior em ruínas, arquitetos especializados ouvidos pelo jornal disseram que restauro da fachada, que é reta, é simples. Ainda mais porque existem inúmeras fotografias nas quais se basear.

Na reportagem, o veículo reproduziu a denúncia, por meio de imagens, do defensor do patrimônio histórico Marconi Andrade, sobre a demolição de parte do imóvel; sem placa de obra, exigência da Prefeitura. O que colocava em questão a falta de materialidade alegada pelo Iphan para o destombamento da construção.

Na época, José Luiz Alqueres, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) manifestou a sua preocupação em relação ao Solar e às cercanias: “Estou preocupado com esta situação, não só em relação a este prédio, mas em torno desta série de atentados em relação à memória histórica do Rio“, disse ele, acrescentando ser o fato “inaceitável”:

“Uma belíssima fachada, de boas proporções, deixada cair, literalmente, para poder tirar a existência de materialidade no negócio mais material que se pode ver. É uma piada“, afirmou o engenheiro, explicando que o prédio simboliza “o Rio dos Vice-Reis, o Rio capital da colônia, depois do império, e da república. Este é um valor único e diferenciado desta cidade”.

Outro especialista ouvido pelo DIÁRIO DO RIO, na ocasião, também demonstrou preocupação pelo destino do São Lourenço, com o destombamento: “Não tenho palavras para manifestar minha perplexidade para um ato desta natureza, pois, provavelmente, irá provocar uma provável avalanche de demolições de Bens Tombados.”, disse ele, sob a anonimato.

Outro, ligado ao IPHAN, complementou: “O destombamento foi no último 25/01. Absurdo. Se for assim não sobrará nada.” O processo administrativo que resultou no cancelamento do tombamento é o de número 01500.003970/2014-01.

Na época do destombamento do Palacete muitas pessoas e entidades ligadas à preservação da memória nacional se manifestaram diante do risco de derrubada da edificação, entre eles o vereador Pedro Duarte (NOVO):

“O Rio é a capital cultural e histórica do Brasil, todo esse patrimônio é fundamental para a nossa memória e para o nosso desenvolvimento. O Solar do Visconde de São Lourenço é uma das joias que não podemos perder. Precisamos, sim, atrair investimento e parcerias que revitalizem o prédio, mas a sua demolição não pode ser uma opção”.

Ao que tudo indica temos novidade pela frente. Esperamos que a cidade passe a contar com mais um espaço revitalizado e à altura da sua bela e imponente trajetória no cenário nacional.